sábado, 14 de agosto de 2010

O Bem Amado

Estou pouco me lixando para esse papo de cinema popular e cinema de autor. Se o filme é bom, tem qualidades, captura o espectador, voilá, cumpriu o dever. Mas, poxa, sacanagem, fiquei frustrado com "O Bem Amado", novo longa do Guel Arraes. Achei que, no mínimo, ia me divertir muito. Principalmente porque o diretor vem vindo num crescente no cinema: "O Auto da Compadecida", superado por "Lisbela e o Prisioneiro", superado por "Romance"...

"O Bem Amado" tem algumas coisas das que mais irritam no cinema de Guel. Uma delas, e que já era forte em "Lisbela", é o uso (abuso) da trilha sonora. A música é utilizada em demasia, e não é trilha de fundo, composição de ambiente etc, é música alta, com o compositor cantando em confronto com o que se vê na tela, na verdade um desfilar demasiado de clipes musicais.

Putz, e a montagem é doida, com cortes em profusão, não pára. Uma cena após outra sem pausa, sem silêncios, sem momentos de descanso ou reflexão. É movimento o tempo inteiro, ação o tempo inteiro. Se ainda assim, tudo conspirasse a favor da história, mas ao contrário, parece que esse mosaico doido apenas enfraquece o que tem de melhor o filme de Guel (e que não é de autoria do diretor e sua equipe): o texto delicioso de Dias Gomes. O texto salva a alma de Guel do inferno, é onde estão os motivos mais fortes para o filme ter a força que ainda tem.

Claro, Nanini construiu um personagem magnífico; Zé Wilker, caramba, o Zé Wilker está incrível como o Zeca Diabo, não pensei que ele ainda fosse capaz de mostrar um trabalho tão bom depois de tanta tralha e tanto isopor nas últimas décadas. O Zé Wilker está vivo como ator. Podia manter essa disposição, essa alma de artista, nos papéis seguintes.

Se temos alguns personagens excelentes, temos muitos personagens que não enchem os olhos. O romance entre os personagens de Maria Flor e Caio Blat me parece apenas uma historinha incluída à força para atrair o público jovem num elenco majoritariamente de coroas. (Parênteses: eu fui um desses bobos que mordeu a isca, e não arrependo: a primeira aparição da Maria Flor tirando a roupa para tomar banho de calcinha valeu o dinheiro da entrada). Mas é um romance que nada tem a ver com a trama principal. Poderia sair sem prejuízo nenhum à história que está sendo contada. Sem falar que o romance em si é falso, numa cena a Maria Flor mergulha na água, Caio é um desconhecido. Na outra cena, ela está brigando com pai para casar com o cara. Hein? Como assim?

Outro desacerto foi fazer um elo forçado (pelo menos soou totalmente artificial) entre a história em Sucupira e os acontecimentos em torno da ditadura militar e a redemocratização do país. Eu ri em vários momentos do filme, o texto de Dias Gomes e a canastrice do personagem de Nanini são um bom casamento, um acerto. Eu achei excepcional o sinistro e iletrado Zeca Diabo do Wilker. Mas esperava muito, muito mais de um filme de Guel Arraes.

Vai ficar me devendo, bicho.

Obs.: devo dizer que Eloá se divertiu de monte, adorou o filme, riu o tempo inteiro. Saiu da sessão com a alma lava e enxaguada.

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