sexta-feira, 17 de julho de 2009

Hirsuta

..."pôs-se de pé de um salto e arqueou as sobrancelhas, que habitualmente não despertavam a atenção, mas que nesse momento se manifestaram negras, hirsutas, gigantescas, sobre os olhos".

A descrição acima é trecho do livro que estou lendo, "O processo", de Kafka. As sobrancelhas descritas pertecem a um juiz de instrução que dialoga com o protagonista durante o que parece ser uma assembléia. Alguém já disse que as histórias de Kafka parecem descrições de sonho. Melhor seria falar em pesadelo, devido à condição, neste caso desconfortável, de quem é acusado sem nem sequer saber o porquê. O que me capturou e me fez trazer o livro até o blog, foi a palavra "hirsuta". Pensei na leitura de jornais e revistas. Mino Carta é um crítico do jornalismo feito para facilitar demais a vida do leitor. O que significa banir as palavras incomuns. Ele vai de encontro a essa tese, diz que "o idioma português tem mais que meia dúzia de palavras. E elas devem ser usadas". Significa não tratar o leitor como mentecapto.

Nem tanto ao mar, nem tanto à terra, penso eu. "Hirsuta" é uma palavra bela, garbosa, mas seria uma pedrinha na leitura, considerando o leitor médio. Eu vi essa palavra pela primeira vez no filme "O homem que copiava", do Jorge Furtado. Ela está no centro de uma cena importante em que mocinho e mocinha estão se conhecendo. E mais importante, é o seu significado que está em jogo nessa cena. A mocinha (personagem de Leandra Leal) lê um poema para o cara (Lázaro Ramos), onde a palavra aparece. Ele não entende e pergunta o significado. Ela não sabe, pesquisa e lhe diz o que leu no dicionário. É uma cena bela, que coloca o obstáculo do entendimento em questão. Não dá para ler o jornal com o dicionário do lado. Por isso, faz sentido o jornalismo mastigar a coisa para quem não tem, em tese, tempo a perder. Sei que vão me chamar de contraditório. O fato é que concordo com isso, sem deixar de concordar com Mino. Siginifica que elevar um pouco mais o nível nos textos de jornal diário não é má idéia. Acho que se temos como objetivo a clareza do que estamos falando, nada se perde com um bom vocabulário. Caso contrário, seria difícil transpor os bons autores que usam bem mais que meia dúzia de palavras. E, no entanto, se fazem entender tão bem.

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Sonhei várias coisas esquisitas essa noite. Sonhei com uma colega da época de faculdade que não vejo há um milhão de anos (não, não é a do post abaixo). Sonhei indo à estréia do filme "Julie & Julia" que quero ver e, entretanto, no meio do caminho, acontecia uma confusão que me deixava nervoso. Por fim, sonhei mais adiante, e de novo, com situação sangrenta. Acho que minha amiga Marlla é que está certa: estou vendo muito o seriado "Dexter"...

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