segunda-feira, 29 de junho de 2009

Machado

Concluí "Memórias Póstumas de Brás Cubas" com a sensação de estar lendo pela primeira vez um livro que já tinha lido. Acho que sei explicar isso. Tem muito tempo desde a primeira leitura, que me causou uma pequena revolução na época. Eu tinha um sentimento todo diferenciado sobre alguns autores dos quais ouvia falar. E me parecia um terreno solene, formal, culto. Quero dizer, sem espaço para o jeito humorado e sardônico que Machado de Assis me revelou à época. Entendi que é possível para os grandes escritores serem imaginativos, fazerem literatura de alto nível, e ao mesmo tempo serem extremamente divertidos.

Neste livro, grande parte dele é dedicado ao amor proibido que Brás Cubas vive com Virgília. Não se trata de feitos notáveis de um grande homem. Mas da vida ordinária de um cidadão que viveu da herança do pai, não casou, brigou com a única irmã e quase não teve amigos. A visão do "defunto autor" é pessimista e a vida é levada sem grandes acontecimentos. A história é entrecortada, vai e vem no tempo, tem inúmeras pausas para relatar aspectos menores, reflexões curiosas, até a morte de uma borboleta, e por aí vai. O que poderia ser um relato sem sal, torna-se uma narrativa interessantíssima pela forma como Machado conduz a coisa.

Em geral, é uma curtição ler o escritor, qualquer livro, qualquer história. Por exemplo, por causa desse novo filme de Julio Bressane sobre obra de Machado, "A erva do rato", eu procurei para ler os contos em que o filme se baseia. Um deles é "O esqueleto". É sobre um homem que mantém em casa o esqueleto da ex-mulher e chega a fazer as refeições tendo o esqueleto à mesa, mesmo em presença da atual esposa que morre de medo de um hábito tão macabro. É uma situação absurda que se explica na história. A forma como é contada e como se dá o desenlace é coisa de mestre, envolvente até o fim. Machado é um escritor que não tem data. Não pertence ao século XIX onde nasceu. Parece cada dia mais atual.

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