sexta-feira, 17 de junho de 2011

"Os homens que não amavam as mulheres"

“No banheiro, ela se apoiou contra a porta e tentou juntar os pensamentos. Estava mais abalada do que achava que devia ficar. Depois, lentamente tomou consciência de que sua bexiga estava a ponto de explodir e de que um banho não era apenas um bom conselho mas uma necessidade após a noite agitada. Quanto terminou, entrou no quarto, vestiu uma calcinha, um jeans e uma camiseta com a inscrição Armageddon was yesterday - today we have a serious problem.”

Gripe chata, dores pelo corpo, moleza no juízo...
Ainda assim fui até o fim com a leitura de "Os homens que não amavam as mulheres", obra de Stieg Larsson.
Não sei se o que vou falar depõe contra mim, o fato é que gostei bastante.
Vários pontos de contato me tornam simpático ao livro
Não vejo problema em se tratar de livro consumido em grandes números, muito vendido, e que rendeu um filme de sucesso no seu rastro.

"Os homens que não amavam as mulheres" conta a história de um famoso jornalista sueco contratado para escrever uma “crônica familiar” sobre um poderoso grupo empresarial de seu país.
Na verdade, o objetivo da missão era desvendar um mistério.
Uma das herdeiras do grupo desapareceu 30 e tantos anos antes, quando tinha 16, em circunstâncias até hoje inexplicadas. Suspeita-se, naturalmente, de assassinato.
O personagem central, Mikael Blomkvist, é repórter investigativo e sócio numa revista.
O bastidor dessa atividade consome boa parte da história contada.
É bacana ver o esforço do autor, Stieg Larsson, em apresentar um material razoavelmente pesquisado, bem escrito e com coisas realmente interessantes a dizer.

O seu ponto de partida e de chegada é o mesmo de outros autores policiais, com investigação, perseguição a um bandido, solução de um crime insolúvel. Há uma série de informações que denotam o tamanho do trabalho que Larsson teve para escrever.
Acho um grande feito ele ter conseguido, por exemplo, manter a sensação de suspense pairando em todas as páginas até onde foi possível.
O livro arrola romance, sexo, relações sociais, conflitos éticos e um enigma bastante bem enunciado. Não há como não seguir as pegadas e continuar ligado.
A anti-heroína, Lisbeth Salander, é uma hacker do tipo mais improvável. Tem uma aparência punk e uma ferocidade constante convivendo com seu tremendo talento para invadir sistemas e obter qualquer informação.
Salander e Blomkvist são os personagens centrais a puxar o novelo de todo o interesse na trama.
E Larsson foi esperto. Conduz histórias paralelas para esses dois personagens só se encontrarem num pedaço bem adiantado da história.
Mas nesse ponto já estamos torcendo por um e por outro.

Admirador de Edgar Allan Poe, eu não resisto a uma trama policial. Do tipo que é preciso olhar uma questão de diferentes ângulos para ir avançando na sua elucidação. Especialmente, quando tudo é explicado pela lógica e pelo encadeamento dos fatos.
Esse é o tipo de narrativa que Larsson nos fornece com competência.
Há, claro, algumas coisas de que não gosto.
Por exemplo, a gente está bem acostumado a ver coisas improváveis em diversas obras. Putz, mas Larsson, com sua personagem hacker por vezes abusa do inverossímil.
Não dá para exemplificar nesse caso, porque a força do romance está no seu efeito surpresa. Mas a forma como no trecho final a hacker consegue manipular certas informações é forçação de barra.

Posso parecer um chato de galochas, mas também achei que tem personagens demais.
A família responsável pela trama principal do livro é imensa e dá para se perder fácil entre tantos membros.
A favor de Larsson, diria que ele não perde o foco de quem realmente interessa. Porém não diminui em mim a sensação de que há excesso de gente desimportante que aparece e some.
O livro traz uma (longa) nota introdutória para cada personagem novo, cada situação apresentada. O recurso faz sentido para situar o leitor, mas há exagero nisso, sem falar que incha a obra com material acessório.
Por outro lado, há elementos menores que tem uma função: dão charme ao relato e criam uma aproximação entre narrativa e leitor. Por exemplo, quando o autor fala em detalhes sobre o que os personagens estão comendo, o que preparam na cozinha para receber uma visita, uma frase que estampa numa camisa ou um gato que se enrosca no sofá se protegendo do frio.

Trata-se de um livro que manipula a trama para obter o máximo da atenção do leitor - e consegue.
Não vejo problema nesse caso, principalmente se consideramos que sempre, nos melhores livros e filmes, o percurso é sempre mais interessante que as respostas que nos são apresentadas.
E nem acho que seja o caso aqui, porque o final de "Os homens que não amavam as mulheres" é bem satisfatório considerando a coisa toda.

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Obs.: quando o amigo Hederverton me enviou os livros dessa trilogia, calculei ler outras coisas no intervalo entre um e outro - até para dar uma respirada. Mas não é o que está acontecendo. Mal terminei o primeiro volume, corri para a edição seguinte: "A menina que brincava com fogo" e já caminho pela página 70 e tantas.

Deus tenha piedade da minha alma.
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