segunda-feira, 18 de julho de 2011

Um lugar qualquer

Não entendo quando alguns críticos acusam um diretor de se repetir.
Melhor, entendo como má vontade com determinados autores.
É óbvio que o autor vai se repetir, é naquele universo que ele transita, são aquelas as suas preocupações, é naquele conjunto de referências que está a sua identidade.
Há então aspectos que estarão em todos os filmes daquele autor, não há como ser diferente.
Alguém diria que a obra é o conjunto total de trabalhos, cada filme ajuda a compor uma obra.
Sendo assim, é muito coerente e muito identificável o novo filme de Sofia Coppola, "Um lugar qualquer", que vi com muito prazer esta tarde.
Todos os filmes dela são realmente parecidos, todos são situações específicas numa vida mais ou menos comum, são recortes delimitados.
Há uma simplicidade, é quase a vida correndo sem intervenção: o ator em seu quarto de hotel, pede sorvete para tomar com a filha, faz um macarrão meio sem jeito, toma banho, anda de carro em longas passagens.
Esses momentos juntos, a forma como são filmados e aparecem para nós, dizem alguma coisa que pode ser entendido como a demonstração de um vazio da existência, o tédio das relações, a falta de sentido em viver e trabalhar num mundo superficial.
Pode ser tudo isso como pode ser a preparação do personagem (e do espectador) para alguma coisa especial que está sendo perdida e pode ser recuperada.
O personagem é dado a perceber que pode obter mais da sua própria vida, que pode mudar de alguma forma.
E esse gatilho está ali próximo: o fato de a filha passar uns dias com o pai desperta nele a vontade de sair do entorpecimento a que sua vida chegou, e querer mudar.
Os personagens de Sofia parecem sempre desconfortáveis no mundo.
Ela sabe manejar bem esses sentimentos, e seus filmes transmitem de alguma forma uma sensibilidade, mesmo quando trata de temas tristes: solidão, relações curtas, hipocrisia, bajulação.
Aspectos que aparecem neste filme e mostram um lado menos atraente da indústria do cinema e entretenimento (indústria que Sofia conhece bem como filha de celebridade e depois ela mesma uma celebridade).
A pequena Cléo, a garota do filme que passa uns dias com o pai, é de alguma forma a pequena Sofia. O filme traz esse alter-ego, que está também em certa medida no personagem do pai.
Gosto cada vez mais de Sofia Coppola. Não me importo nem um pouco que seus filmes orbitem em torno dos mesmos temas.
Não é assim também com todos os grandes artistas?

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